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Foi neste livro que destaquei, entre tantos trechos definitivos, uma frase que estava aplicada ao amor, mas que se aplica, na verdade, a tudo:

“A proximidade do fim dá o senso da raridade”. No livro, o risco de o amor acabar deu a um dos amantes a súbita noção de quão raro era aquele sentimento e de como seria impossível desfazer-se da relação. É no amor que mais testamos essa verdade: na iminência da separação, nosso músculo cardíaco convoca às pressas todas as emoções dispersadas e recobra seus batimentos, enquanto manda avisos urgentes ao cérebro: não desista, não desista, não desista.

Vale para o amor, vale para a vida. A proximidade do fim é algo que comove. Outro dia vi uma jovem apresentadora de televisão debulhar-se em lágrimas, ao vivo, por estar gravando o último programa pela emissora em que trabalhava, já que havia assinado contrato com outra. Nenhum arrependimento, nenhuma armação de marketing. Era o senso da raridade se manifestando frente às câ­meras, a raridade de ter feito amigos, de ter obtido sucesso, de ter passado por algo verdadeiramente bom.

O senso da raridade sempre nos intercepta na proximidade de uma despedida. Costumamos compreender as coisas tarde demais. Passamos muito tempo ausentes de nós mesmos, anestesiados por um ritmo de vida que parece imutável, até que muda. Não é de se estranhar que seja na velhice que o senso de raridade nos arrebate: a raridade de poder caminhar sem amparar-se em ninguém, de poder enxergar o mar sem o embaçamento da vista, de pronunciar a palavra futuro sem constrangimento.

 

MEDEIROS, Marta. Liberdade Crônica, Porto Alegre: L&PM, 2016. Pg. 68-69

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