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“Chineizando” o direito administrativo

Recentemente, li um artigo sobre o processo administrativo chinês. Fiquei feliz ao descobrir que, atualmente, podemos conhecer até mesmo o direito da China sem falar mandarim. Quando estava na faculdade, direito chinês era algo de outro mundo. O único contato possível era por intermédio do filme Justiça Vermelha, no qual Richard Gere era acusado de assassinato, e sofria um processo que não obedecia ao devido processo legal.

Ao ler o artigo, percebi que o filme não era despropositado, pois, até as mudanças decorrentes da Constituição Chinesa de 1982, o direito administrativo era, em parte, regido por regulamentos secretos. Esse fato, aliado à possibilidade de prisões administrativas, gerava arbitrariedades.

Embora o caráter autoritário permaneça nos dias de hoje, pois subsistem prisões administrativas e há ampla discricionariedade na aplicação de sanções, o direito administrativo punitivo chinês segue rumo à liberdade. Como exemplo pode-se citar a lei chinesa de processo administrativo, que entrou em vigor em maio de 2015, e ampliou as hipóteses legais de ações contra o Estado.

O direito administrativo punitivo brasileiro, no entanto, caminha em sentido oposto. Condutas ilícitas e sanções são descritas de modo cada vez mais aberto, possibilitando uma grande discricionariedade por ocasião da aplicação de punições. Um exemplo se encontra na lei de improbidade administrativa, que pune a violação do “dever de lealdade às instituições”, embora ninguém saiba o que isso significa. Outro exemplo é a sanção de multa prevista na lei anticorrupção, que pode variar entre R$ 6 mil e R$ 60 milhões.

É preciso brecar o rumo autoritário que segue o direito administrativo sancionador brasileiro. Autoridades são alguns durante algum tempo. Cidadãos somos nós por toda a vida. Aumentar a autonomia do Estado para aplicar sanções é diminuir a segurança jurídica dos cidadãos. É criar um país onde manda quem pode e obedece quem tem juízo. É “chineizar” o direito administrativo punitivo brasileiro. E se alguém tiver alguma dúvida de que isto é ruim, viaje para a China. Nos dias de hoje, fica “logo ali”.

Artigo originalmente publicado no Jornal A Notícia
na edição de 10 de julho de 2015

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