Aprendendo com a coreia
Recentemente, o ditador da Coreia do Norte, Kim Jong-Un, cometeu uma nova maldade. Desta vez, foi uma atrocidade à estética dos jovens coreanos. Primeiramente, obrigou os estudantes da capital Pyongyang a redefinirem o estilo capilar. Obrigou todos a utilizarem o mesmo corte de cabelo do líder máximo da nação. Posteriormente, estendeu a obrigação a todo o país. Doravante, os coreanos deverão raspar os cabelos no lado da cabeça e manter a parte de cima espetada. Em um momento de magnanimidade, admitiu uma variação, que consiste em permitir que os cabelos sejam penteados para baixo e divididos ao meio.
A notícia é tão esquisita que prontamente seria considerada uma piada caso tivesse sido publicada a respeito de um país como a França ou a Inglaterra. É fato que houve quem a desmentisse, mas não se pode negar que se trata de algo que, no mínimo, tem verossimilhança.
Espera-se de tudo em um país como a Coreia do Norte, que tem uma ditadura hereditária. Para alguém que lança mísseis como se estivesse a soltar fogos, coloca pessoas em campos de trabalho forçado e assassina qualquer opositor político, estipular um novo corte de cabelo é “café pequeno”. Qualquer notícia esquisita ganha foros de verdade em um regime como esse. De qualquer modo, a situação serve para ilustrar em que consiste uma ditadura. Não se estabelece uma ditadura com o objetivo de salvaguardar uma revolução; faz-se a revolução para estabelecer a ditadura. Em regimes totalitários, a simples obediência não basta. É necessário extinguir a individualidade. É preciso acabar com todas as formas de arte e suprimir a distinção entre a beleza e a feiura. Busca-se o poder pelo poder.
Ninguém jamais toma o poder com a intenção de largá-lo. Ele não é um meio. É um fim em si. O objetivo do poder é o próprio poder e nada mais. Como adverte Norberto Bobbio, é preciso lembrar dessa realidade nos tempos de hoje, em que a cega vontade de poder que dominou a história do mundo tem a seu serviço meios extraordinários para se impor.
George Orwell, em seu livro 1984, fez uma alegoria para refletir a vida do cidadão em um regime totalitário que continua atual. Segundo ele, em um mundo dominado pelo grande irmão, a vida é representada pela imagem de uma bota pisando em um rosto humano. É nisso que devemos pensar sempre que estivermos diante de qualquer regime ditatorial.
* Artigo publicado no Jornal A Notícia, em 12 de maio de 2014